Wednesday 28 March 2007


A confusão
A confusão da alma que domina por completo o corpo sem se aperceber que existe um porquê que nos conduz, solitários, pelo silêncio e através de um campo de coisa nenhuma, onde nasce a tristeza, o medo, a loucura, o desejo, a incerteza, o grito mudo e a mediocridade espiritual que termina quando a confusão se instala por entre as linhas estranhas e irregulares de um pensamento sem lógica, embebido em poucas cores vibrantes, enganando um cego que não quer ver… eu próprio, em mim e principalmente sem mim, percorrendo-me a pouco e pouco numa sinfónica e desafinada confusão de alma…


Escreve ele, o meu Norte, numa letra de criança e algo perturbadora, significado do quão perdido ele está por dentro. Perdeu-se a minha criança, o meu guia, levou-me com ele na imensidão dos caminhos conturbados porque passa e tem passado ao longo de todo este tempo…

É um desassossego, um sufoco procurar sem encontrar o que conhecemos a vida inteira. Ele está lá e não o vejo de tão embrenhado que está na vastidão do seu sofrimento, tão único e egoísta; não me deixa partilhar com ele o fardo da genialidade que tanto o confunde e o afoga em mágoas antigas, nas palavras que ficaram por dizer no momento certo. Di-las alto e bom som, ouve-as em eco como se as dissesses em tempo real.

A áurea sensorial que nos une faz-me sentir na pele a sua inquietude artística que parece não ter fim. Há tanto para dizer, tanto para expressar e parece tudo inatingível, insaciante. O amanhã também existe e não tens de viver tudo num único minuto.

Pensa em mim, pensa no amanhã, pensa no futuro que vamos ter em simultâneo, pensa na velhice que prometemos um ao outro sempre com a união que é só nossa. Estás a deitar tudo a perder. Estás a deixar que algo perturbe o que tenho de certo contigo. Estás a permitir que algo interfira no curso que está estipulado. Eu não sei lidar com as mudanças. Eu não sei lidar com a tua mudança.

A minha mente afasta-se de mim, foge ao largo e não sei mais o que seguir. O meu Norte perdeu-se, perdeu-se na rota dos ventos. Não tenho mais sonhos a seguir. Os teus eram os meus. A memória divide-se e nem tu sabes já o que sonhavas.

Tu eras o Norte, eu o Sul, estávamos completos de coisas de que nem precisávamos falar. O sentimento escondido de sermos unos; chego a pensar se não seria somente meu esse sentimento que dava razão de ser ao imaginável. Não quero que seja.

É como que iniciar uma viajem sem retorno, daquelas que fazemos sem nunca sair do lugar, passando por lugares a que sabes que nunca vais conseguir regressar. Mas não podes ter-te perdido assim, eu não deixo, não admito… não posso acreditar que tudo era falso porque não era. Era tudo tão palpável ao ponto de cravar na pele a arte que te define. Tu estavas lá e sempre estiveste. E estás lá, eu só não te vejo, não te consigo encontrar.

Segue tu agora rumo ao Sul, ao umbigo que nos gerou; segue-me porque o que se passa é mágico, sempre foi, e há mais além do sonho. Tens de te obrigar a abandonar a toca fria e imunda onde te refugias tal animal indomesticável. Eu tenho de ser alguém. Segue‑me ao sítio que reclamo como meu, eu afago-te em afecto e compreensão e sem críticas. É tudo incondicional ou és tu o cego que não quer ver?

Friday 23 March 2007



Julgo ter ficado sem opções…


Nem o que pensar surge com clareza! A incerteza dos motivos que nos levam a fazer as coisas, as constantes promessas que me fazem ser descrente da boa vontade e da sinceridade das palavras.

“Vou ligar”, depois não ligas… à segunda volta, “depois eu ligo” e não ligas de novo… E já nem espero que o faças! Só espero… Nem sei porquê. Na expectativa de que possa ser desta vez. E para quê? No fim surge sempre a mesma confirmação, de que não vens, não hás-de vir, em busca de mim…

Passas por mim num corredor e não me falas. Será que já não me vês? É possível que a despreocupação seja tal que me torne pra ti, subitamente, apenas mais um dos corpos incógnitos que se passeiam e por ali passam, numa verdadeira correria, azáfama de vida.

Eu sei que estou diferente e aceito a dificuldade em me reconhecer no meio de tantas coisas novas que tenho em mim mas o esquecimento… A minha essência de viver, o que nos aproximou, o que despertou em ti a vontade de mim, apenas isso, julgo ser difícil não reconhecer.

E é difícil quando nem me olhas, quando a minha presença deixa de ser importante ao ponto de deixar de despertar em ti a curiosidade natural de quem se cruza algures na vida, aquele olhar que deitamos ao dono do vulto que repentinamente entra no nosso campo de visão, que surge diante dos nossos olhos postos no chão ou num monte de papéis, em qualquer coisa que nos exija a concentração quando deambulamos, atrapalhados, pelo corredor.

Julgo ter ficado sem opções…

Pensei que houvesse, no mínimo, a vontade de perceber ou esclarecer alguma coisa. Afinal… eu sinto essa necessidade, eu preciso de saber tudo, ao mínimo pormenor. Não suporto já o adiamento do momento reservado para nós. Angustia-me a espera eterna por algo que não vai surgir.

Somos… fomos amigos; importamo-nos… importávamo-nos um com o outro… Preciso saber, sentir de novo a sensação de estar perto de ti para, noutra tentativa vã, tentar perceber o que é que me puxa, o que é que me faz tremer cada vez que sorris, o que me desconforta no teu olhar. Seguir‑te-ia para onde quer que fosses, não percebes?! E sem porquês, sem inconvenientes, sem entraves ao rumo a seguir, apenas com o que sinto por ti!

Mas não posso continuar assim. Subitamente, desisto! A distância entre nós é, contudo, enganadora. Induz-me no pensamento de que aos poucos tudo vai morrendo, perdendo a importância de ser, perdendo a fonte de alimentação e sustento. Mas nada morre, nada se desvanece com a ausência, está tudo apenas adormecido.

E basta-me um vislumbre de ti para que tudo ganhe novas proporções, gigantescas, assustadoras. Mexes comigo de uma forma estranhamente agradável. Perturbas-me, desconcentras-me do meu objectivo de te deixar ir com tudo o resto que por mim passa. Mas não consigo não te reter. Pareces entranhado em mim, tal cheiro a pele, inesquecível. Assemelhas-te a um fobia que não se consegue combater e toma controle de nós.

É frustrante perceber que nada do que se constrói é sólido; é frustrante perceber que os investimentos no afecto e na amizade são feitos a fundo perdido… Palavras, palavras ditas em vão ou com significado, conversas e mais diálogos…. Perca de tempo, a minha conclusão. O que resta afinal? Um sabor amargo de quem quer perpetuar o que pensou ter conquistado e percebe, finalmente, que é impossível conquistar. Não existe, não é real!

E custa ver que isto faz parte da minha vida. À minha volta tudo permanece, menos comigo…. Tamanha frustração! Tamanha a minha solidão…

Ouvi uma vez dizer: “eis que é chegada a hora de reequacionar a minha solidão!”; palavras tão fortes, sentimentos abruptos irrompidos com a chegada da perda eterna! Algo que no momento me capturou tal âncora que nos puxa para o fundo do mar. A sensação de pânico que nos invade ao perceber que nos falta o ar, que nos vamos afogar na imensidão do mar. É o sonho que me apoquenta as noites mais conturbadas. Essas palavras proferidas na dor inundaram a minha alma, senti-me asfixiar só de pensar que talvez tenha chagado o meu momento, aquele em que começo a equacioná-la…. A solidão, o vazio e mim! O vazio que sinto quando penso ti! A saudade do que não tive contigo.

O sorriso vai morrendo embora transpareça aos outros; tudo em nós vai morrendo um pouco a cada dia… a cada momento em que se vê o afastamento do resto do mundo, das pessoas, do que julgamos nosso. E o afastamento de ti…

Tu não sabes mas há alguém a sofrer, magoado por reter tudo lá dentro, por não se livrar de todo o seu mal, por não conseguir fazê-lo. Mas no fundo, a verdade é indolor, basta deixar o amor transparecer e tudo desaparece. E eu estou condenada. Porque me sinto perdida no meio da tempestade que tu criaste. E não te vejo em lugar algum; não vieste em meu socorro!

Julgo ter ficado sem opções…

Thursday 15 March 2007

Living in Your Afterglow


E quando a saudade aperta
A dor suprime o coração,
O ar falta e as lágrimas inundam o olhar.
Surge o abraço vazio.
Aperto os braços contra o peito
Como se estivesses lá; e estás.
O cheiro volta
E o teu riso ecoa aos meus ouvidos
Como se nunca tivesses partido.

Que saudades, que vontade de gritar
Vestir-te como se fosses pele, usá-la para sempre.
Sentir de novo a textura macia
Que jamais tornarei a tocar.
Volta para mim nem que seja em sonho
Onde nada é impedido
E vive para sempre comigo
Como se nunca tivesses partido…

Não havendo marinha para navegar as lágrimas
Nem praias onde chegar,
De nada me serve fazer o esforço de chorar.

Levanta-se uma ventania inútil
Da Lembrança
E só me resta virar-lhe as costas.
E ir embora a fingir que se torna tarde.

Nunca fui sentimental
Até ao fim do que poderia ter sentido...

Wednesday 14 March 2007

Viajar Sem Sair do Lugar


Do canto de um quarto escuro vem o som. Notas tocadas em sequências de tamanha harmonia, que nem melodia, que nos embala e nos transporta pra longe da imensidão do negro que me assusta…

Levitamos aos poucos e deixamo-nos ir como se cada nota, suavemente tocada, nos desse o impulso pra voar, viajar sem sair do lugar.

Subitamente, estou no centro da praça ampla, em meados de Março, apanhando banhos daqueles primeiros raios de sol que nos relembram o cheiro característico do Verão. Corre uma brisa que me despenteia os cabelos, fá-los balançar, estou perto do mar. E curiosamente falha o cheiro, falta a maresia que vejo estampada em cada canto da praça, no rosto dos velhinhos sentados em fila e em silêncio, abrigados por debaixo dos ramos de uma árvore que não consigo identificar, uma árvore milenar.

Um deles ergue e segura nos lábios, de vez em quando, um cigarro quase que interminável. Está ali e está tão longe e eu estou fixa nele. É o olhar, a postura cansada dos anos vividos no mar onde ainda deve estar, de viagem em viagem e com tanto pra me contar. O olhar parece fixo na linha do horizonte como quem anda em alto mar procurando terra onde poisar; olhar tão abstraído no tempo real e parece mesmo ignorar as paredes caiadas de branco das casas que rodeiam a praça. Ele vê além delas.

Os outros estão apenas saudosos de tudo o que foram, de tudo o que foi. Têm tanto para contar e tanto para falar e, no entanto, o silêncio parece ser-lhes suficiente. A companhia inerte uns dos outros dá-me uma sensação de que nada lhes faria sentido de outra forma; o passado se assim não fosse, então o que teria sido.

E o tempo vai passando, de hora em hora, e pouco neste cenário muda. Ouve-se de vez em quando a ilustração da nostalgia quando alguém diz em jeito de recordação “tempos difíceis… bons tempos!”.

Bons tempos… que estranha descrição para um passado triste que vivemos. Mas que tanto nos revela acerca de nós. Será pela simplicidade de épocas. Será que com o passar na vida nos tornamos exigentes ao ponto de nada ser o suficiente para nos preencher, como aqueles tempos simples de sofrer. Será que nos tornamos cínicos ao ponto de nos recusarmos a reconhecer que não fomos felizes, que não eram tempos felizes. Parece‑me ilógica a nostalgia que a dificuldade de viver causa em nós. Será meramente saudade dos tempos árduos que passaram que nos levam a usar tal descrição. Será que é a luta diária que nos traz o sentido de viver. Será que sou eu tão pequena que não consiga entender.

De repente ganho mobilidade. Dou uns passos em direcção ao pontão. A imensidão das águas calmas invade-me de tal forma, tal é a leveza do ar que me liberta por momentos de todas as sensações. A música continua a soar no fundo da minha mente. Estou vazia de tudo e isso confunde, desconcerta-me porque não consigo respirar sem sentir. As imagens relampejam perante mim e não as fixo. Porquê? Se tudo o que sou se espelha através das minhas recordações, não posso perder-me agora deixando-as ir. Tudo o que reconheço é através das coisas que vivi e senti e disse a dada altura da vida. E o que será de mim sem tudo isso? Mas está tudo no redemoinho das ondas à beira mar como que uma metáfora para aquilo que tem sido a minha vida. Tudo confuso, tudo incompleto, quase tudo perdido.

Perdi-me a mim própria? Tudo vai e tudo volta, rodopia e se dissipa mesmo perante mim. E eis que então entendo o olhar fixo do homem do mar. Ele procura o conforto do conhecido, ele procura reviver tudo o que fez sentir-se vivo, sentir-se feliz. Será que os tempos difíceis são os que nos fazem sentir vivos. Será que são os que nos dão o ímpeto para ultrapassar qualquer dificuldade.

Mas nada que faça, nada que viva, nada que diga será para sempre. No segundo seguinte tudo é já passado. E a dificuldade do passado de que ele sente falta será a minha dificuldade do futuro, será a luta por permanecer em cada momento, a insistência em reter o que julgo conhecer e que é tão desconhecido. E será que faço algum sentido?

Tenho medo do desconhecido, e eles também. Só que idade permite-lhes descansar recordando apenas, a idade dá-lhes a segurança de que pouco mais têm a conhecer, a idade deu-lhes a certeza de que não há nada a temer no viver. A idade arrasta consigo a esperteza de perceber que o truque de viver é aprender a não temer o que pode acontecer.

E consigo ainda ouvir a música; já tem textura. A sala continua escura e eu continuo insegura. Assusta-me o que tenho pela frente. Ver o que há para ver, sentir, perder, viver… é a nossa fatídica sina. Uma fatalidade de coisas boas e más que nos ensinam a ser quem somos. E eu tenho ainda tempo para aprender e reter além daquilo que me faz sofrer.

E ele permanece a viajar, com o olhar fixo no mar e sem sair do lugar.

Saturday 10 March 2007

Complexidade Inerente a Nós Próprios

Afinal o que seria de nós sem a complexidade? Julgo que a vidinha que vivemos tão intensamente (ou pelo menos deveríamos vivê-la dessa forma) não teria o mesmo gosto!!!!! O que seria de nós se tudo nos fosse facilitado, estivesse mesmo à mão de semear?!!? Acho que é uma das características da condição humana, tornar tudo mais difícil do que é.

E no que toca aos relatos relacionais e emocionais, as coisas não são diferentes!!! Se nos magoamos é porque deixamos que isso aconteça! É porque a nossa mente viaja demasiado, fantasia as situações, nos prende ao que nos faz mal; um certo masoquismo no fim de contas!! Não sei bem porquê mas desenvolvemos uma certa tendência pra remoer o que mais nos desconcerta... típico! Pelo menos sentimo-nos vivos dessa forma, experienciamos sensações! Mas, adiante...

Imaginado uma situação hipotética, munida de imenso realismo porque, no fundo são aquelas situações que acontecem diariamente no imenso universo; há sempre um grande amor, há sempre um grande desejo de ter alguém perto de nós , há sempre uma enorme vontade de partilhar com alguém especial a nossa vida (no bom e no mau), ter sempre alguém em quem encostar a cabeça, mesmo que seja para estar em silêncio, sei lá, alguém que nos complete e mais nada!

Quando finalmente temos o que procuramos, não o aproveitamos. Há sempre algo que interfere, que nos aborrece, que nos zanga, que estraga tudo. E porquê? Porque complicamos sozinhos o que é tão fácil de viver; porque temos sempre de questionar tudo e pensar e repensar até as mais pequenas atitudes; queremos sempre mudar alguma coisa, por livre e espontânea vontade nossa, temos a tendência de estragar a pintura, ficamos inseguros com a mínima alteração de humor. Será que deixou de nos amar?! Será que fizemos algo de errado?! Afinal o que mudou!??!? Nada! Na realidade, não acontece nada e nós sempre a complicar!

A instabilidade somos nós quem a fazemos, a dor é infligida por nós a nós próprios. Seres superiores?!?!? Onde está a nossa superioridade se não aproveitamos sequer o que temos de melhor sem o questionar? Dizemos que não somos nada sem o amor; e será que quando amamos, o fazemos na sua maior plenitude? Será que quando amamos o fazemos despreocupadamente e vivemos da forma simples, da forma como o amor nos surge na vida?!?!?

Pedimos demais sem perceber o que realmente nos faz falta e isso confunde-nos, isso não nos deixa sentir. E, mesmo assim, mesmo depois de sofrer, continuamos a complicar porque a mágoa faz-nos recear o que se segue.

Há quem nunca mostre o que sente sem saber o que os espera, ser ou não correspondido - a grande questão de todas quando tudo está pra começar; porquê?!?! Devemos celebrar o amor apenas porque o sentimos, é um privilégio tão grande!!! Devemos agradecer o simples facto de perceber que amamos porque é isso que nos distingue de todos os seres vivos. Estamos sempre a proteger-nos de quê? De sentir.

Garantidamente, com tantos raciocínios que desenvolvemos pra que seja tudo perfeito, pra nunca deixarmos de ter o que estamos a viver, não há quem nos magoe mais do que nós mesmos; nós impedimo-nos de ser felizes, mesmo que seja apenas por um ápice, um momento que passa muito rápido e nos deixa saudosos. E então!!??!? Sentir é o que é importante e ponto! Só isso me faz sentir bem, amar sem pedir nada em troca, sentir-me viva por sentir algo real mesmo que seja só meu!!!

No fundo, aquilo que procuro, como todas as pessoas, é sentir-me normal, o mais banal possível, o mais simples possível no que toca ao amor, aceitar o que a vida me dá, a sua generosidade de me permitir sentir o amor, permitir-me sentir viva!!! Equilíbrio? Conseguimo-lo sem sentir o amor na sua plenitude? E será que nos permitimos sentir sem restrições!?!?!? Amar por amar, sem pedir em troca, sem esperar retorno!!!!

Friday 9 March 2007


Amanhece. As poucas horas de sono deixam o meu corpo torpe. Mais um dia na minha vidinha tão monótona; nada de novo de adivinha! Sei que tenho de sair, encarar o quotidiano tão simples mas o corpo pede mais descanso! Acabo por sair da cama e ainda não é dia sequer. Visto-me depois do momento de higiene obrigatório e saio de casa.

A madrugada fria, as mesmas pessoas deambulam pela rua, as mesmas de sempre. Subitamente, uma leve brisa gélida que me faz lacrimejar! Momentaneamente perco a visão, torna-se turva e vejo o Mundo de forma diferente; tudo está enevoado!! Sigo pela rua e dou com o café do costume! Entro e procuro a minha mesa de eleição! É tudo tão certinho e tão cómodo, tudo tão conhecido!

A mesa fica mesmo perto da janela que dá para a rua movimentada de gente desorientada e adormecida como de costume. Tiro o meu diário, a caneta que me deram no 15º aniversário e abro mais uma página. O Bóris, o amigo imaginário, está pronto para me ler novamente!! O cumprimento matinal, o desabafo do cansaço de mais um dia e, do nada, sou avassalada por uma voz interior que me diz que algo de surpreendente vai surgir! Não perco mais do que 10 segundos a pensar nisso; não quero!

As pessoas de sempre entram no café, os cumprimentos de sempre ocorrem há anos; são para mim como tu, “estranhos íntimos”! São tão familiares que me deixam segura e, no entanto, nem sequer me conhecem! Paro por uns momentos enquanto mexo o meu café e olho a rua, a correria sem rumo das pessoas atordoadas com o amanhecer, e começo a pensar em mim, mais uma vez um vazio, um rumo desconhecido, sentimentos que me guiam e confortam sem os saber explicar! A vontade de mudar diariamente e o comodismo, o receio de o fazer!

Tudo corre como planeado até que, inesperadamente, me dou conta que o meu Mundo está prestes a desabar! O pânico, o desconforto, o susto!!! Não sei o que sentir, não percebo o que vejo!

Dou comigo a fixar, no canto oposto da sala do café, uma nova silhueta, vulto desconhecido que me esforço por identificar; busco na memória, e busco novamente, um registo que me identifique quem está do outro lado, quem vem e se atreve a ameaçar o meu equilíbrio vivencial. Nada, não há nada que me indique, que me sossegue!! A inquietude começa a sufocar e só penso que tudo está prestes a mudar! Não pode ser, é impensável permitir que um vulto desconhecido ameace a minha segurança. Não quero que isso aconteça. A minha vida é, por vezes, vazia mas confortável e não estou disposta a perder isso! É mais fácil!

Mas a curiosidade e a necessidade de esclarecer o que está a acontecer torna-se, de segundo pra segundo, mais forte que qualquer coisa! Quero ver quem é mas tenho receio de sair do meu cantinho perto da janela; contudo é mais forte do que eu! Chamar a atenção ao pânico que estou a sentir também não é uma opção, mas tenho de ver.

Levanto-me disfarçadamente, vou deslizando suavemente por entre as gentes que vão entrando e saindo, as mesmas de sempre mas isso já não importa! Alcanço então um ângulo que me permite ver quem invade o meu Mundo e a frustração dá as caras! Por entre as frestas da persiana semi-aberta os raios de sol cumprimentam o Mundo e cegam-me!! Momentaneamente perdi a visão, não vejo nada à minha volta, deixei de me ver a mim. Sinto o vulto mover-se desconcentrado e como que perdido e não sei o que fazer, se regresso ao "lar", se prossigo e enfrento o meu maior medo neste momento!

Como que por destino, o sol sobe e deixa-me dar de caras com um par de olhos gigantes que me tiram o ar. Paro e fico estática, não tenho reacção absolutamente nenhuma! Só consigo fixá-los e não sei, sinceramente, o que pensar. São enormes, têm uma cor que jamais vi antes, um calor frio como que morto para as emoções e, ao mesmo tempo, a transbordá-las! Estou confusa, deveras!

O mundo deixou de existir, o barulho de fundo da máquina de moer café apagou-se e as vozes tornam-se distantes, cada vez mais. Só estamos ali os dois, os meus olhos naqueles que nunca antes enxerguei. É tão estranho não é? O medo de que tudo mude, deixei de o sentir.

O olhar é mesmo diferente! É um olhar de um vulto estranho mas é tão familiar, não sei mesmo o que pensar. Tento ser o mais racional possível e tentar perceber o que se está a passar e faço uma análise do que vejo - um olhar completamente novo, cheio e vazio ao mesmo tempo, que me está a mostrar coisas tão novas, e fico ali. O que vejo é que as emoções são possíveis, estou a tê-las. A sensação de que não são precisas palavras para as conhecer e, obviamente, a interacção física é importante!

Estou a ler uma vida tão conturbada, perdida e sem objectivos, com medo de tudo: de ser rejeitada, de sentir algo diferente, de falar o que pensa, de ouvir o que a magoa, mas com tanto amor para dar, com vontade de partilhar amizades e afectos, sem ruídos; não são necessários! Um olhar que vibra com qualquer coisa que o preencha e que não descansa até ver esclarecido tudo o que não entende.

Existe ali sinceridade e medo de falar, existe uma necessidade de sentir e de tocar. Estranho, um olhar pede o toque físico! Mas é mesmo assim, sem toque sente-se vazio como sempre se sente! No fundo, um misto emocional tão intenso e tão controverso, tudo de bom para todos e já para si.... O sonho, sonhar também lá esta! Viajar mundo fora sem sair do lugar, ver tudo e todos, memorizá-los e revê-los como que uma película de filme que passa vezes sem conta, a qualquer momento que se queira, porque a vida é mesmo assim, passa mas também fica, mostra e ensina a continuar a procurar seja lá o que for!

A adrenalina de sentir tão profundamente qualquer emoção é tão grande que o coração dispara e parece que não cabe no peito de tão pequeno que fica!

As sensações que me assombram agora começo a reconhê-las, são tão familiares essas que já li naquele olhar e tantas outras que nem consigo expor por palavras; não há palavras que as descrevam. Tenho mesmo de as conhecer dia a dia!

Subitamente, o chão sai-me debaixo dos pés e tudo se torna tão claro e mais real não podia ser! Estou tão assustada com o que vejo e, ao mesmo tempo, mais surpresa não poderia estar a sentir-me! Que revelação! Todos os receios que tive 15 minutos antes deste momento deixaram de existir; sinto-me pacificamente alegre e começo a acreditar que tudo vai mesmo mudar embora esteja ainda a resistir a essa ideia! Agora já percebo que é inevitável a mudança nas nossas vidas porque não as conseguimos controlar. O que tenho de fazer mesmo é aprender a aceitar a mudança e a conviver com ela, quer seja boa ou má. Mas ela implica uma evolução que nos torna maiores, mais adultos. Também nos faz abdicar de muito, ou de tudo se for necessário, e torna-nos mais fortes!

E então vejo-me a mim, finalmente a mim; o meu olhar reflectido no espelho que, por acaso nunca tinha visto. Irónico não? Tomar tudo por garantido e, no fundo, existe algo que eu desconhecia; e é precisamente isso que me mostr que tudo é uma constante mudança!!!! E tudo muda de facto! Só me custa a aceitar!!!

Olhar Sobre Mim


"Escrever sobre o olhar, porque não? Não escreverei de um modo estruturado, organizado e previsivel... lógico, porque nem considero que o tema o permita, como o exprimerei mais à frente; nem sinto a capacidade de o fazer.

O Olhar

Em primeiro lugar, é, sem dúvida, importante reflectir sobre de onde vem e porque vem. De onde vem, pois, graças a diversos provérbios e a situações estranhas da vida quotidiana dos povos, ao longo dos tempos e da nossa vivência em especial, aprendemos que um olhar vale, se uma imagem vale mil palavras, muito mais que isso.

De onde, portanto, vem o olhar? Questão longe de ser unânime, é, acima de tudo, complexa e controversa.

O “porquê” presume-se mais fácil então. E é. Porque sentimos.

Posto isto, podemos de regressar à questão inicial, ao fundamento do olhar. Ora fundamentar algo abstracto e mutável (esquecendo por momentos a sua variabilidade circunscrita a mudanças de humor perante situações da vida, mesmo que físicas), não se assemelha fácil. Mas também o que é “assemelhar” e “fácil”.

Nunca ninguém me disse que a vida seria fácil, portanto não há razões para assumir que seria, ou será. Isto vale também para todas as coisas com ela relacionada. Considerando nós o Olhar forma fundamental de relacionamento (daí a existência destas linhas) apenas poderemos reflectir como sendo parte essencial da vida. O relacionamento com Tudo.

Salvaguardamos neste primeiro ponto que não é o facto de ser invisual que torna esta forma mais ou menos importante. O desenrolar do esboço trará mais luz, por certo, ao leitor mais atento, sobre esta problemática do textualismo, bem como da complexidade do termo “Olhar” como aqui o entendemos e todas as suas vertentes e influências na vida activa
das gentes.

Voltamos à tentativa de abordagem do tema com que começamos - o fundamento. O mais provável é mantermos este pressuposto até ao final...

De que nos serve o olhar? No seu sentido mais restrito (stricto sensu), olhar será o incauto acto de ver. Sendo que a contraposição com ver, significa que este é o “olhar” mais atento, o “ver” com o cuidado e o raciocínio, a lógica e o peso do “ver”. É um acto reflectido, pesado, e importante; é o que nos torna mais cautelosos, o que nos faz sobreviver. É ver onde os outros olham.
Ora, feita a distinção, o que nos interessa afinal é o Olhar. O estigma por detrás da retina. A força por detrás da irís. O ser por detrás do olho. O viver.


Pois não é de racionalidade que é feito o Mundo. Não é de lógicas cabais e inabalavéis. É feita de olhares. De caracteres. De conjuntos ou confrontos de forças. De se ser acima de tudo e de todos, e a luta pelo ser, e por ser acima de tudo e de todos. É feito de convicções e princípios, os nossos, como o de ser feliz sem magoar os outros e independentemente do resto. É feito de Vida.

Há dúvidas? Não. Pois sabemos que assim é. Não é o facto de ser mais confortável pensar que é possível controlar tudo, o que é preciso é manter-nos a nós e aos outros alerta; o facto de ser habitual e da própria inteligência nos levar ao “ver”, isso não é o que desmerece ou retira o “olhar”. Olhar é sem dúvida o essencial do ser humano enquanto o realcionamento fôr o seu essencial. E o “ver” vai sempre ser subordinado do “olhar”, enquanto não formos sempre verdadeiros. Teorias à parte, sabendo a impossíbilidade deste último factor, o importante não é ver (sem o desmerecer); mas o Olhar, é Olhar com o devido respeito por isso. É o sentir.

Talvez com exemplos práticos, ou semi-práticos, ou teóricos... Talvez assim:
Se dissesse-mos sempre a verdade que ocorreria? Nada porque nunca chegariamos a lado nenhum senão talvez a uma morte rápida e dolorosa.

Mais, se fossemos sempre sinceros o que ocorreria (sendo que a diferença entre verdade e sinceridade está nas omissões ou na falta de dissimulações)? Tudo porque o Nosso Mundo cairia por completo. Nunca somos sinceros connosco mesmos.Tentamos sempre parecer que o somos ou por medo de perceber as nossas inseguranças, ou apenas pra não mostrar que também temos fraquezas. Que não são fraquezas, que são a nossa natureza. Somos verdadeiros às vezes, mas sinceros raramente (e por estupidez se me perguntarem!). Raramenrte com outros.

Ora, o que pretendiamos exemplificar vai no seguimento do parágrafo anterior. O ver é o que nos premite viver, ou sobreviver (outra disctinção intressante a recuperar mais à frente sem dúvida). Permite-nos dissimular o raciocínio mais óbvio e inato no Mundo. É essa capacidade de dissimularmos e analisarmos os dados de um modo livre de instintos e ultilizando a nossa capacidade mental, quase na totalidade, o que permite que tenhamos tudo o que temos.

Por muito triste que isso soe, é também o que nos premite sobreviver. Assim falo, pois acabo de regressar de tal viagem em que se não confiar a 100% no meu olhar, reflexos e intintos, bem podia não voltar. E na nossa vida diária é mais que óbivo isso. Daí não perdermos muito mais tempo aqui.

O olho é sem dúvida (bem sabemos que são dois, e que formam um par, mas assim é mais cientifico o que escrevemos) o órgão primordial nas relações humanas. Vamos saltar, ilibar-nos nestas linhas de discursar sobre relações humanas e as suas influências que, para além do óbvio do olhar, serão essecialmente o carácter, a auto-confiança, a apresentação, os trejeitos, a educação, a voz, o cabelo, o cheiro do cangote... apesar de tudo ser resumivel ao olhar. Daí ser esse o fundamento a partir do qual agora será considerado este tema uma tese."

Thursday 8 March 2007


Sem saber muito bem porquê a mente viaja, leva-nos aos recantos mais escondidos que temos em nós… a mente não é coisa fácil de controlar, muito menos com o passar do tempo. Há sensações que o corpo sente falta, sons que deixamos de ouvir e continuam a ecoar no fundo da memória, coisas que ficam por dizer e ao repensar a vida, elas regressam…. Não é mesmo nada fácil de controlar!

Sem saber muito bem porquê a mente foge-nos e sempre pra onde mais nos magoa, o que nos faz mais falta, o que sempre quisemos fazer de forma diferente ou mudar. Os pormenores começam a dissipar-se, as imagens a perder nitidez, o cheiro perde o odor.... e o que é que resta?

Sem saber muito bem porquê a mente engana-nos, impõe-nos coisas que nem sabemos se queremos, faz-nos crer em coisas de que nem sequer temos certeza! Uma realidade distorcida ou inventada por ela? Afinal o que é que nos resta?

Sem saber mesmo porquê, a nossa vontade muda e impulsiona-nos a cometer loucuras, desatinos, o que consideramos constituir no nosso futuro das melhores lembranças da nossa vida…. ironicamente, as que mais nos irão magoar ao recordar. E o futuro vai chegando, todos os dias….

Sem saber porquê, mas começando a questionar, a vontade de mudar começa a fazer-se sentir; a vontade de recuperar tudo por inteiro, reviver, recriar faz cócegas no impulso do corpo como o balanço das ondas…

E sem nunca saber porquê, é a saudade que nos resta e é nela que tudo termina…. porque sem perceber porquê, não há nada que possa mudar o que passou!